Salvador, 26/11/2025 21:06

Brasil

Judiciário não é palco político: A perigosa partidarização das Eleições do TJBA

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Foto: Divulgação/TJ-BA
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As eleições para a Mesa Diretora do Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA) deveriam ser um processo de escolha interna, discreto e focado na capacidade técnica e administrativa dos desembargadores. Previsto para acontecer no dia 19 de novembro, contudo, o que se observa no cenário atual é uma crescente e preocupante politização que desvirtua a tradição da Corte e ameaça a necessária sobriedade do Poder Judiciário.

É uma eleição que desvirtua do que acontece por exemplo no Tribunal Regional do Trabalho (TRT-BA), onde acontece uma eleição pacífica, baseada em um “acordo de cavalheiros”, e da própria dinâmica da eleição do Supremo Tribunal Federal (STF), onde há um rodízio, para que os membros mais antigos da Corte, que nunca foram presidentes, se torne Presidente do Tribunal guardião da Constituição.

A mais recente disputa interna tem revelado uma tendência nociva: a importação de um modelo de campanha similar às eleições majoritárias e partidárias da política eleitoral. Neste cenário, a tendência nos próximos anos é de que até contratem campanhas de marketing político. Este é um caminho perigoso que pode macular a imagem de imparcialidade e neutralidade que o Judiciário, por sua natureza e função constitucional, é obrigado a zelar.
A materialização dessa “partidarização” é nítida.

O desembargador Jatahy Júnior, por exemplo, optou por uma estrutura de campanha que formaliza a disputa nos moldes da política tradicional, com direito a chapa formalizada e até a confecção de “santinhos” para divulgação interna. Falta apenas o número para se assemelhar de vez a uma eleição legislativa ou executiva. Esse modelo, embora possa ser visto por alguns como modernização ou transparência, na prática, insere uma lógica de facções e polarização que não é saudável para um órgão de cúpula da Justiça. Se tem chapa, tem promessas, se tem promessas, tem vínculos, com vínculos, se tem padrinhos…

Em outro flanco, a atuação do candidato José Rotondano tem gerado controvérsias e até um folclore interno. Sua postura de “prefeito” ou “marido de aluguel”, como satirizam os corredores do Tribunal, ao tentar capitalizar cada pequena melhoria ou conquista administrativa, demonstra uma campanha baseada na autopromoção personalista e na propaganda de feitos, algo típico do marketing político, mas desalinhado da discrição exigida pela magistratura.


Rotondano não hesita em alegar para si o mérito por avanços importantes: se a imagem do TJBA melhorou em Brasília, é “por causa dele”; se os juízes e desembargadores terão mais assessores, é “por causa dele”. Esse “verdadeiro lobby” alcançou seu ápice quando se comenta, nos bastidores, que ele teria atuado decisivamente para evitar que a então presidente, desembargadora Cynthia Resende, sofresse a temida intervenção do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) em maio do ano passado.

À época, o Tribunal precisou emitir nota para esclarecer notícias veiculadas pela imprensa sobre a possível intervenção na Corte, que havia passado por uma inspeção da Corregedoria Nacional de Justiça. Rotondano, portanto, se apresenta como o “salvador” da gestão e o articulador político fundamental, aquele que “apaga incêndios” institucionais de alta gravidade.

Nem todos se renderam à tentação da pompa eleitoral. A desembargadora Ivone Bessa Ramos, ao se manter alinhada às tradições e optar por não formalizar uma chapa, sinaliza uma resistência à polarização. Sua chapa simbólica, composta por “ela, Deus e todos os santos”, reflete a convicção de que o excesso de holofotes e a partidarização fragilizam a instituição. O Judiciário precisa de estabilidade, não de palanques.

O Regimento Interno do TJBA, ao regulamentar o processo, busca justamente assegurar a solenidade e o foco no mérito.
Os cargos que compõem a Mesa Diretora são, portanto:
Presidente do Tribunal
1º Vice-Preside
2º Vice-Presidente
Corregedor Judicial
Corregedor Extrajudicial

E o Art. 11, inciso 1, define a ordem de votação, evidenciando que a eleição é para cargos individuais, e não para chapas:
§ 2° – A eleição será realizada em escrutínio secreto, relativamente a cada um dos cargos, observada esta ordem: 1) – Presidente; 3 2) – 1° Vice-Presidente; 3) – 2° Vice-Presidente; 4) – Corregedor Judicial; 5) – Corregedor Extrajudicial.


A estrutura regimental prevê a escolha de Desembargadores para cargos de administração superior, com responsabilidades eminentemente técnicas e institucionais. O espírito da norma é de uma eleição de pares, não de “partidos”.
Quando a disputa se transforma em um festival de marketing político e polarização de “chapas” — que, regimentalmente, nem existem — o foco se desvia da administração da Justiça para o jogo do poder. O risco é que o futuro Presidente, Vice-Presidentes e Corregedores se sintam mais devedores de “alianças políticas” internas do que da imparcialidade e da eficiência que a sociedade e a Justiça baiana demandam.

O Judiciário não deve ser um palco político. Sua força reside na discrição, no conhecimento e na estabilidade. A Mesa Diretora do TJBA precisa de gestores-juízes, não de políticos-eleitos. A atual tendência de partidarização é um mau presságio para a autonomia e a credibilidade do Tribunal. É imperativo que a Corte retorne à sobriedade de suas tradições, antes que a politização permanente comprometa sua missão essencial.

Se é para ocorrer eleições com criação de chapas políticas, que se permita também que os juízes de primeiro grau possam votar em seus candidatos, já que são esses os que mais sentirão os efeitos de uma boa gestão ou não do TJBA.

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